Indagações Impertinentes
Nos idos do collant de lycra – quem se lembra dessa coisa de vinte anos atrás? – eu reparava como eram só as gorduchas que vestiam aquilo.
Pois hoje de manhã, ao pegar o metrô pro escritório no que haveria de ter sido apenas mais um trajeto rotineiro, tivemos que evacuar a composição em Foggy Bottom porque um dos “clientes” passava mal e precisava de cuidados médicos. (Hoje em dia nesta cidade o metrô não transporta mais “passageiros,” transporte “clientes.”) Como a manhã estava ensolarada, prenúncio dos dias de verão que teremos pela frente, mas ainda sem o calor que faria qualquer padeiro senegalês desmaiar exausto, resolvi caminhar até Farragut North – coisa de 10 minutos – em pleno centro da cidade.
Foi ao longo dessa travessia que eu observei como tinha mulher calçando sandália, todas elas expressando sua individualidade irredutível através do fashion statement de um par de havaianas (que não cheiram, não soltam a tira, e não deformam.)
Todas elas, com exceção -- calculo eu com certo otimismo cego e injustificável -- das mulheres de pé bonito, que os mascaravam naquele escarpin tipo “fatia de pizza:” todo pontudo no bico alongado e arredondado no calcanhar.
Levantei a cabeça e segui meu caminho, sem rosnar com a feiura dos pés à vista, minha seara repentinamente descortinada pela promessa de uma postura mais elevada, meu nariz altivo não por um esnobismo qualquer mas por mero instinto de sobrevivência.